Há momentos em que a nossa vida muda, muda para sempre. E
desejamos voltar dois segundos atrás. Dois apenas. Desejamos retroceder no
tempo, desejamos voltar ao momento em que tudo parecia ser “normal”. Desejámos
voltar aos dias em que era importante comprar aquele vestido, arranjar o
cabelo, dizer adeus sem abanos, desejamos voltar aos dias em que nos deitamos
na nossa almofada sem ter “nada” que nos tirasse o sono.
É quando se ouve aquela notícia, que nunca esperaria ouvir, que
o chão lhe foge. E foge-lhe para tão longe que o bom senso foge com ele. E vêm
os calores, a falta de ar e de força. E vêm à cabeça imagens que não queremos.
É, quase como, deixar cair uma bosta de azeite, que quando corremos para
limpar, fica cada vez mais sujo e peganhento.
Dói, dói muito.
E depois da dor, vem a revolta. E depois da revolta, vêm as
vertigens, os pesadelos e as lágrimas salgadas.
São momentos tão inexplicáveis e tão ruins, que o tempo
pára. E queremos que seja um pesadelo. Queremos que não seja verdade.
“Ok, eu agora vou abrir os olhos, vou respirar fundo, e vai
desaparecer. Não vai ser verdade.”
Tão bom que assim fosse. Tão bom.
E depois de chorar, berrar, gritar, bater com a cabeça nas
paredes, dar socos nos peitorais do marido, você constata que a realidade se
mantém. Ela não é alternativa, nunca foi.
Depois de vários momentos repetidos, chega o momento de
parar. Limpar os olhos borrados, pedir um lenço e assoar-se. Levantar a cabeça
e começar a pensar. Vem cá fora, fuma um cigarro, ou dois, ou três e começa por
surgir uma luz. E depois a força para correr em direção ao chão que fugiu.
Encontra-o e abraça-o, pede-lhe para que não fuga de novo.
Começa a ganhar côr, começa a sentir o cheiro da esperança e
o abraço da fé.
Cruza as mãos e os dedos e começa a falar com Deus. É altura
de fazer o pedido mais forte que alguma vez foi feito.
Cura a minha mãe, meu Deus. Dá-lhe força, fá-la acreditar
que é possível vencer.
E passado uns minutos consegue dizer “ okay, a minha mãe tem
um cancro.”
Minutos depois e já acrescenta “bora lá, então, combater
esse motherfucker.”
E, apesar dos calmantes serem o nosso melhor amigo nas
noites que se seguem, voltamos a conseguir pensar. E choramos. Claro que
choramos. Mas choramos porque não queremos , não, por não acreditarmos.
Porque é possível. Eu sei que é possível. Porque no meio de
uma notícia tão berrante e tão cruel, há sempre alguma coisa menos má. E nela
que nos temos de agarrar, com unhas e dentes, para o que der e vier. E ter
força, muita força. E dar muitos beijinhos na boca à nossa mãe. Dizer-lhe o
quanto é bonita. O quanto é forte e fofinha.
Esta luta ainda agora começou, mas tenho esperança, fé e
força para poder acreditar que vai ser SÓ
mais uma superação. E, mais tarde, de mãos dadas, vamos olhar para trás e
recordar como é possível vencer. Acredito nisso. Acredito mesmo!
Por isso Sorria.
Sorria mesmo quando chove. Mesmo quando tudo está preto.
Sorria
Sorria quando parece que não é possível. Sorria sozinha.
Sorria sempre.
E mesmo quando recebe um abanão, sorria-lhe. Mostre-lhe do
que é capaz, porque é possível.
Amem-se uns aos outros, e mostrem-no.
Não deixem para amanhã!